13.6.10

Tic Tac

minha bala tic
tac frenética

indica o ritmo intenso

que conto as horas (tic
tac) do relógio quebra-
do; pra te encontrar

teu cheiro de menta
anestesia o gosto ruim
de saudade

é NOIZE!

A grande festa de música eletrônica de Juiz de Fora.


Noize
Dj's Jota Jota, Kureb, Moa.
Live Show ZEMARIA.
19 de junho, 23h, Privilege.

10.6.10

J. Enigmática

(é verão. as fotos espalhadas pelo chão. ventiladores ligados espalhando a poeira da casa esquecida. louças a lavar. correspondências que nunca serão abertas. bijuterias perdidas que nunca reverão as donas. um pé de sapato. um grampo de cabelo. o porta retrato está quebrado. foi você, eu me lembro)

J. cruzou a sala sem falar comigo
a arranhar o assoalho
com seus pés de fogo.

largou o casaco rosa-sintético no sofá,
e pediu uma dose.
(antes que eu negasse
serviu-se em gesto bruto)

ajeitou a franja feito esperança,
a mascar seu chicletes .

- Eu sei que você me odeia.

(e) manda que eu prepare suas malas
e a embarque no primeiro ônibus.

[guardando na mala suas vontades,
seus poucos anos,
suas infrações adolescentes,
aflições, sessões de análise,
teu par de sandálias, e mais nada]

J. sempre chorou à toa
mas rasgar babado do vestido
de petit pois é novo.

bate no peito a arranhar colo
avermelhar as tatuagens com as unhas
de esmalte vermelho, a dizer asmática:

- Eu não mereço, mas eu vou, calhorda! 

6.6.10

1

Sobrara apenas o dissabor de encher os olhos com a cena da sala.
Dezenas de olhos presentes não percebiam as paredes mal-caiadas e os buracos na telha. Só o pó solitário sobrava nos cantos e se acomodava com o vento a penetrar por entre as frestas da porta quebrada. As janelas que haviam, cerradas. O pai de todos espalmava mãos velhas como se fechasse o rosto. Bebia o café e não mais se importava em fechar os últimos botões da velha camisa, deixava transparecer a cor amorenada do sol e as rugas da lida, o peito a guardar costelas aparentes, a magreza de sempre. Não se barbeara naquela manhã por que decidira nunca mais se barbear, e o rosto agora evidenciava os cabelos brancos que o chapéu escondera a vida toda.
Lá fora se formava uma fila extensa de resignados a caminhar lentamente, passo a passo em direção a porta quebrada, que agora estava aberta, convidando todos a entrada. A multidão em silêncio orava palavras incompreensíveis entre os dentes como se confidenciassem seus próprios pecados. Mas a maior parte das crianças, essas brincavam como se nada acontecera. Corriam e gritavam pela pequena capoeira verde que fazia sombra, no chão, e entre os galhos ressecados e os troncos derrubados para fazer mais um curtume. Brincadeiras de pique-pega. Alguns exibiam contas de vidro, outros porretes de dar em cabeça de cotia. Os menores de todos, mais santos, traziam, orientados pelos pais, terços benzidos, e vestiam branco a emular anjinhos do céu. Esses pequenos predestinados a guardar almas em dias difíceis vinham na frente conduzidos pelas madrinhas batismais. Vinham acalentar almas injuriadas e guardar a alma do morto.
O pai de todos encontrava-se agora sentado na velha banqueta no canto da sala. Conservava os olhos tristes e o olhar parado como se sentisse sono. Uma a uma, as crianças foram entrando. A primeira entregou a ele uma vela branca comprida para ascender a alma do morto. A segunda, trouxe um manto lilás com o nome do respectivo e a inscrição de um santo de sua devoção. A terceira trouxe um abraço que o mais velho de todos recebeu, ainda indiferente. Posicionaram-se a esquerda da mesa de se fazer refeições, que agora se encontrava próxima a janela e não mais ao centro, e em cima da mesa um café fraco e doce exalava aroma bom, mas ninguém ainda tivera tido coragem de se servir. Havia algumas quitandas do dia anterior. A mãe nunca ousaria deixar as visitas sem algo de comer, mas não restaram forças para fazer as fornadas de delícias frescas para o dia tão fatídico.
No centro da sala havia um caixão dos mais simples. Pura madeira a guardar o corpo de um jovem.

5.6.10

3 poemas manjados pela ocasião do aniversário desta cidade

Princesinha Hype


bom dia princesa de minas,
me responda no sotaque adequado
não me deixe mais cabisbaixo de tanto torpor
te sinto meio cansada, pouco alucinada
sufocada pela fumaça
pela tristeza
princesinha hype
te imagino uma linda descolada
de botas e cartucheira querendo dançar
por 48 horas sem parar
vamos juntos minha nobre senhora
exorcizar a caretice
vamos bailar pelas ruas
por seus bares
seus monumentos

vamos juntos profanar todos medos
descobrir anseios
destampar os seios
para abalar seus primos chatos
vamos acampar no parque halfeld
aproveitar o dia e a noite

para curtir o amanhecer
e esquecer
de tudo que passou




ANATOMIA DA CIDADE


a cidade irresistível
se oferta com seus
pares de coxas de botecos
sem roupa
e sua espinha dorsal do calçadão
seus braços a São João

seus cabelos a Marechal
e eu, marginal
prefiro a Galeria dos Previdenciários
ao Marechal Center
(tiro os óculos escuros e por lá
passo olhando as pessoas nas filas)

o sedutor umbigo desta
mulher, juiz de fora
mora na praça da estação
à cinqüenta metros
do Bar do Vágner
parte iluminada
perfumada
exaltada

e se ousas ultrapassar a ponte
chega à púbis
entrada da zona leste
onde reside a vida
de fato nos pagodes
e bailes funk
nos muros decorados pelos
grafites

e à muitos quilômetros
está minha zona norte
que vívida na cidade
a impulsionar a libido
deste corpo,
ficou sem adjetivação nesta poesia.



JÁ PASSOU A HORA


eu queria mesmo era ver
Murilo Mendes trôpego
nas ruas desta cidade
subindo pro Vitorino
vestindo um short
afinal life is short
e na tradução de Geraldinho
life is short significa
“a vida é um shortinho”

queria eu na verdade
botar Belmiro Braga na roda
fazer uma rave na roça
enxarcá-lo de incertezas fazê-lo
declamar poesias
cometer heresias

é passada a hora meus caros
de arrombar a porta da academia mineira
de letras
pra deleite
dos letreiros
pra desespero dos leiteiros
que sofrerão com a universalização
da cachaça diária anti-lactente

bota o poeta em cima da mesa
bota o ovo de colombo da palavra em verso
e choca toda essa farra pra ver
se sara
essa cidade carente

meu parceiro, insisto
(já que sou assim inconveniente)
essa cidade já passou
da hora
de ir embora de si mesma